Wednesday, July 06, 2005

Como enfrentar um dia frio

Para enfrentar um dia frio

luva
quente
café olhando os emails do dia
ler Lemu e suas crônicas do tempo curto
dar um toque no celular pra avisar o meu coração
que o dia já nasceu
morrer de saudade dos beijos de bom dia
querer dormir sempre mais um pouco
rir com Flá e comer cueca virada com café e açúcar gelado
caminhar na rua olhando para as janelas frias
querer saber de Gui
imaginar K-b-ça lá na Europa
pensar nas mil e quinhentas coisas urgentes que eu tenho pra fazer
lembrar de contar para Ernesto da carta que a Flá recebeu da imobiliária
fica quieta senão a gente manda te prender por arruaceira
lavar a cabeça debaixo do chuveiro quente com o shampoo novo
perder cinco minutos do dia pensando em onde tem um café onde eu ainda
não tenha lido todas as revistas
cappuccino ou cortado alto
lembrar da cocada mole da Gabby
pensar de como eu estou feliz e de quanta coisa ainda tem que ir pro seu lugar
seu lugar é aqui do meu lado moço, como diz Teca
E leva um século pra chegar o meio-dia
manteiga de cacau é coisa de pobre meu filho!
eu uso cêra de abelhas da Neal's Yard porque eu sou fino bem!
aqueço meus dias com o teu nome escrito no meu pescoço

Friday, July 01, 2005

De um dia só

Hoje eu fiquei aqui. Um dia só.
Só, na manhã dourada, na sala de largas janelas. Perto das violetas que nunca dão flor.
Ouvindo os ruídos que eu não ouço nos outros dias. Porque existem coisas que a gente só ouve quando está sozinho.
Esperando a porta abrir e deixar entrar a alegria derramada de minha mãe que a tantos comove, encanta e a outros irrita. Penso: como pode alguém sentir-se tão alegre e disposto logo de manhã cedo?
Esse sempre foi um dos mistérios que me acompanharam vida afora.
Em qualquer lugar do mundo que eu vá, eu sempre hei de esperar pelo momento em que ela vai abrir a porta e sorrir seu bom dia inigualável.
Mas hoje não. Hoje eu acordei descalço de afeto, enrugado nas dobras do sono agitado: tanta coisa, tantos signos e lendas e palavras difíceis de registrar e entender.
Penso neles por aí, os dois eternos namorados zangados e brigões, mas um não vive sem o outro.
Uma doce libriana e um tosco sagitariano, que dupla!
Aos Sagitarianos que eu amo de paixão eu explico: toscos no sentido de dizerem coisas da maneira que os centauros estão acostumados, não há nada de mal nisso, viu Ernie, viu afilhado?
Minha indolência me convence a ficar em casa e imaginar delícias feitas com cuidado e carinho, lentamente na cozinha, e eu penso: vou fazer um arroz de puta pobre.
Isso decidido, ganho a rua e compro bons punhados de cheiro verde e linguiça calabresa e outras coisas mais que eu imagine.
Volto e faço minhas alquimias apimentadas. Corto, pico, descasco, canto (o que raramente faço), fumo bons cigarros e, de repente, ouço a voz no telefone: vamos almoçar aqui no centro, estamos num curso!
A caçarola chiando não entende coisas assim.
Pronto, almoço e durmo.
Lá se foi quase um mês de dia, eu eu resolvo voltar à rua e ir atrás de um bom e fumegante cappuccino.
Desço as escadas e me deparo com uma cena incomum: um pintor lixa vigorosamente as paredes do corredor do meu prédio, revelando a face original da parede, a que viu minha infância impossível por entre os veios de argamassa.
Essas paredes não são pintadas desde a década de 80, sabia? - digo eu ao pintor.
Ao que ele replica: sério? Há quantos anos tu moras aqui?
E, de repente eu me sinto velho demais para os meus poucos trinta e sete anos - constato: eu moro aqui há vinte e cinco anos.
Nossa, foi ontem.
Ainda ontem eu corria loiro por estes corredores. Sim, porque eu era loiro.
Tantos anos pesaram subitamente e eu me sentei nos degraus da escada e tentei me lembrar de como eu era.
E me lembrei.
Feliz.

SECRETA